Após relatos de abuso sexual, mais mulheres acusam João de Deus

Após a divulgação de depoimentos de mulheres que relataram ter sido abusadas pelo médium João de Deus, mais pessoas fizeram acusações de abuso sexual. Ao Jornal Nacional, uma delas contou que tinha 15 anos quanto foi pela primeira vez à Casa Dom Inácio, em Abadiânia (GO). Já a TV Anhanguera mostrou o caso de uma ex-funcionária que também diz ter sido vítima do médium.

Os primeiros 13 relatos foram divulgados pelo programa Conversa com Bial e pelo jornal O Globo. Em nota divulgada ao Conversa com Bial, João de Deus negou as acusações (leia na nota completa no final desta reportagem). O G1 tentou contato com a assessoria de imprensa do médium, mas não houve retorno até a última atualização desta reportagem.

Novos casos

Uma mulher que preferiu não se identificar disse ao Jornal Nacional que frequentava a Casa Dom Inácio desde 1991, sempre acompanhada da mãe. Ela afirma que, na única vez em que ficou sozinha com João de Deus, foi vítima de assédio.

Já a ex-funcionária ouvida pela TV Anhanguera, afiliada da TV Globo, conta que foi à Casa pela primeira vez em 2005, para buscar uma cura para a filha, e depois voltou por causa de um tumor. Ela conta que os abusos ocorreram quando ela estava sozinha.

“Na primeira ocasião, ele pegou um colchão que tinha no corredorzinho e colocou no chão. Ele mandou eu tirar a roupa, eu tirei. Não entendi muito bem. Da outra vez que eu fui, ele sentou na poltrona dele, tirou as calças e mandou eu mexer no órgão dele”, relatou a mulher.

De acordo com a ex-funcionária, ela teve medo de denunciar o médium à Polícia Civil. “Era medo, medo de me expor, ele tem costas quentes né, poderoso em Abadiânia e em Goiás”, afirmou.

Primeiras acusações

As mulheres relatam terem sofrido abusos sexuais de João de Deus durante atendimentos espirituais. Dez histórias foram reveladas no programa Conversa com Bial desta sexta-feira (7). Outras três foram publicadas pelo jornal O Globo.

“Não se trata de questionar os métodos de cura de João de Deus, muito menos a fé de milhares de pessoas que o procuram. Estamos apenas dando voz a mulheres que se sentiram abusadas sexualmente pelo médium”, disse Pedro Bial durante o programa.

Apenas uma das mulheres ouvidas por Bial, Zahira Leeneke Maus, uma coreógrafa holandesa, aceitou se identificar. As outras, todas brasileiras, disseram que preferem não mostrar o rosto, por sentirem medo e vergonha.

Zahira fez recentemente uma denúncia pública no Facebook – quatro anos após a violência sexual relatada por ela. “Eu sei que tenho sido criticada: ‘Por que você está vindo com a sua história, se ele está curando milhares de pessoas?’ E essa é uma das razões do porquê eu não disse nada. Porque se fosse só eu, eu que engula, porque ele está curando milhares de pessoas, certo? Mas agora eu sei, ele está abusando de centenas de mulheres e meninas”, afirmou Zahira.

A coreógrafa conta que, depois da publicação na internet, ela começou a ter contato com outras mulheres que diziam ter passado pela mesma situação.

Padrão de comportamento

De acordo com os relatos, João de Deus agiu de forma similar em todos os casos. Durante os atendimentos espirituais coletivos, o médium teria dito para as mulheres que, segundo a entidade, elas deveriam procurá-lo posteriormente em sua sala, porque tinham sido escolhidas para receber a cura. As entrevistadas dizem que, uma vez que elas estavam sozinhas com ele, eram violentadas sexualmente.

“Pegava na minha mão para eu pegar no pênis dele. (…) Ele falava: ‘Põe a mão, isso é limpeza. Você precisa dessa limpeza, é o único jeito de fazer isso'”, disse uma mulher que procurou João de Deus para cura espiritual.

De acordo com Zahira, ao ouvir os relatos de outras mulheres, ela percebeu que “existe um sistema. A primeira coisa é ‘vire de costas, eu vou te curar’. Existe um padrão (…) Você é manipulada a acreditar na cura”.

O jornal “O Globo” ouviu quatro das dez mulheres que falaram ao programa “Conversa com Bial”, além de três outras vítimas. Os relatos, colhidos ao longo de três meses de investigação, foram divulgados na íntegra no site do jornal. Dentre todas as 13 mulheres que denunciaram João de Deus, Zahira foi a única que contou ter sido penetrada por ele.

Segundo uma das mulheres, o médium demonstrou saber que aquilo que estava fazendo com ela poderia ser considerado assédio sexual.

“Calma, eu não estou com tesão, mas preciso fazer isso para te curar”, uma delas relatou ter ouvido de João de Deus durante o abuso. Segundo ela, o religioso a obrigou a masturbá-lo enquanto ela chorava, aos soluços.

“‘Eu sei muito bem o que estou fazendo e que isso seria considerado assédio, eu não sou louco’. Dizia que estava me livrando das energias negativas”, relatou a segunda mulher, que disse ter sido constrangida a segurar o pênis do médium. Em um determinado momento, ele teria dito que não era mais a entidade ali, que era o homem.

Zahira relata estupro

A holandesa Zahira disse que esteve mais de uma vez em Abadiânia, em busca de espiritualidade e de cura para um trauma sexual. Ela chegou a ser treinada para ser médium.

Ela conta que, numa das vezes em que esteve em Abadiânia, foi convidada para uma consulta particular com João de Deus. E que o médium a levou até um banheiro, na sala dele, e se posicionou atrás dela.

“Aí ele agarrou minha mão direita e a colocou por trás de mim na calça dele. E eu fiquei, tipo… tem esse momento em que você congela. Por que isso está acontecendo? Por que eu tenho que tocar no seu pênis, para ser curada? Ele tem um sofá grande no banheiro. Ele me levou até lá e me botou de joelhos na frente dele. Ele abriu a calça e colocou minha mão no pênis dele. E ele começou a movimentar a minha mão em cima do pênis dele. E eu estava em choque. Eu ainda não posso acreditar nisso. Mas eu estava congelada. E ele continuava falando, conversando, falando sobre minha família. Você está sendo manipulada a acreditar, enquanto ele estava me analisando ou fazendo alguma coisa. Aí ele disse: ‘Você deveria sorrir. Você deveria se sentir feliz’. E eu: ‘eu não sinto nenhuma alegria’. Isso não é o motivo de eu estar aqui. Aí ele estava se limpando, fechando as calças de novo, ele me levou pro escritório de novo, ele me botou no sofá, abriu um armário com pedras preciosas e disse que eu poderia escolher uma. É como se fosse um pagamento. Isso é um pagamento? O que está acontecendo aqui?”

Zahira disse que sentia como se estivesse sendo manipulada, arrastada para aquela situação. Dias depois, ela voltou à casa. “Ele me puxou de novo para o banheiro. […] “Um padrão parecido, mas ele deu um passo adiante. Ele me penetrou por trás e, de novo, esses… Eu nem consigo descrever.”

‘Não vai falar para ninguém’

Uma das brasileiras entrevistadas disse que participava de um atendimento em grupo, quando também foi convidada por João de Deus para encontrá-lo mais tarde na sala dele.

Informações:

https://g1.globo.com/go/goias/noticia/2018/12/08/apos-relatos-de-abuso-sexual-mais-mulheres-acusam-joao-de-deus.ghtml