Desvios de verba pública em RR somam R$ 190 milhões, aponta Polícia Federal

Os desvios de verba pública em Roraima investigados em operações da Polícia Federal somam R$ 190 milhões. Em menos de um mês, foram deflagradas três operações e cumpridos 26 mandados de prisão preventiva.

A primeira a ser deflagrada foi a Escuridão, em 29 de novembro, para desarticular uma organização criminosa envolvida em desvios de recursos públicos do sistema penitenciário de Roraima. Pelo menos R$ 70 milhões foram desviados entre 2015 e 2018.

Na época, a polícia cumpriu 11 mandados de prisão preventiva e 20 de busca e apreensão em Boa Vista e Brasília, no Distrito Federal.

Entre os presos, estão Guilherme Campos, filho da governadora Suely Campos (PP), acusado de ser dono da empresa envolvida no esquema. Ele chegou a pedir habeas corpus, o que foi negado pelo ministro Reynaldo Soares da Fonseca, do Superior Tribunal de Justiça.

Ronan Marinho e Josué Filho, ex-secretários de Justiça, também foram presos em Boa Vista durante a operação. O deputado eleito Renan Filho foi alvo da operação e está preso, acusado de ser “laranja” da empresa de Guilherme.

Cinco dias depois, em 4 de dezembro, a Polícia Federal deflagrou a Operação Tântalo, para desarticular organização criminosa envolvida em desvios de recursos públicos de merenda escolar no âmbito do Programa Mais Educação entre os anos de 2016 e 2018. Pelo menos R$ 19 milhões foram desviados.

Foram cumpridos cinco mandados de prisão preventiva e sete de busca e apreensão em Boa Vista. Entre os presos, está o ex-secretário adjunto da Educação Shiská Pereira, que é mantido no Comando de Policiamento da Capital (CPC).

Ontem, dez dias após a última ação, a Operação Zaragata foi deflagrada e cumpriu 10 mandados de prisão preventiva e 12 de busca e apreensão em Boa Vista. Entre os presos, está a deputada eleita Yonny Pedroso. Há ainda um mando para o marido dela, Wallace Barbosa, que foi candidato a suplente na chapa da senadora Ângela Portela.

A Controladoria-Geral da União indicou diversos indícios de irregularidades em contratos. Num deles, o órgão aponta que os pagamentos indevidos podem chegar a quase R$ 50 milhões. Juntos, somam R$ 139 milhões de desvios.

COMO FUNCIONAVAM OS ESQUEMAS

Segundo a polícia, as investigações da Operação Escuridão começaram em 2017, após informações de supostas irregularidades em contratos de fornecimento de alimentação para as unidades prisionais.

O esquema teve início no começo de 2015, com a contratação emergencial da empresa Qualigourmet, constituída havia apenas oito dias para cuidar do fornecimento de marmita para os presos no Estado.

As investigações mostram que a empresa, responsável pelos fornecimentos desde 26 de fevereiro de 2015, até a presente data, superfaturava o valor da alimentação, além de informar quantidade superior de refeições ao que era efetivamente providenciado e de fornecer alimentos de baixa qualidade.

Os responsáveis pela empresa, que está em nome de laranjas, realizaram saques de aproximadamente 30% do valor dos contratos, em espécie, para o pagamento de propinas e para o enriquecimento ilícito dos reais proprietários do negócio.

Já os inquéritos referentes à Operação Tântalo foram instaurados em setembro de 2018, e com poucos meses de investigação já foi possível constatar irregularidades e desvios que ocorriam no fornecimento de alimentos para merendas das escolas do Estado.

“O esquema criminoso já estaria em andamento no início de 2016 e contava com o falso atestado de recebimento de produtos adquiridos pelo Estado. Desta forma, a empresa responsável pelo fornecimento dos alimentos fazia a entrega parcial dos produtos faturados, ou os substituíam por produtos mais baratos, recebendo o atestado de recebimento integral destes por servidores integrantes do esquema”, detalhou a Superintendência da PF.

REFLEXOS NA EDUCAÇÃO

Falta de transporte escolar, merenda e estrutura marcaram a Educação de Roraima nos últimos quatro anos.

Empresas de transporte pararam as atividades devido à falta de pagamento do governo. Pelo menos 40 veículos desta natureza estão parados na Praça do Centro Cívico como forma de protesto.

Em escolas da capital e do interior, faltam merenda e estrutura, motivo pelo qual pais e professores de alunos da Escola Estadual Alcides Miguel de Souza, localizada na região do Taboca, no Cantá, fecharam o local e colocaram madeiras e cadeado na porta central. Eles também criticaram a falta do transporte e reivindicaram o pagamento das empresas.

RELEMBRE

Em julho, a Polícia Federal deflagrou a Operação Gárgulas, que investiga um desvio de R$ 3,5 milhões na Secretaria de Justiça e Cidadania (Sejuc) de Roraima. À época, foram cumpridos dez mandados de busca e apreensão em Boa Vista e Manaus. A ação era para desbaratar organização criminosa por desvio de recursos federais, lavagem de dinheiro e fraude à licitação. As investigações continuam.

Em 2017, uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) foi criada para apurar as condições do Sistema Prisional do Estado. Segundo o relatório aprovado pela CPI, existe superlotação nas unidades prisionais, falta de medicamentos e atendimento médico aos presos. Metade dos detentos não foi condenada e o prazo de cumprimento da pena de muitos já se encerrou sem haver julgamento.

NOMES

Zagarata faz alusão ao estado de desordem em que se encontra tanto a prestação dos serviços de transporte quanto os próprios contratos.

Tântalo faz referência ao personagem da mitologia grega que foi castigado a nunca conseguir alcançar água e alimentos, apesar de viver cercado destes em abundância, restando em eterno suplício.

Escuridão implica a nona praga do Egito, história detalhada na Bíblia Sagrada, quando o povo viveu momentos de trevas por causa das ações do faraó. A praga veio após a dos gafanhotos, nome da operação que investigou aquele que é considerado maior escândalo de corrupção em Roraima.

Informações: Roraima em Tempo