O empresário e novo secretário da Saúde de Roraima, Airton Cascavel, e o deputado estadual Éder Lourinho (PTC), devem ser julgados no final deste mês pela Justiça Eleitoral por suspeita de compra de votos no 1º primeiro turno das eleições de 2018.
O jornal Roraima em Tempo teve acesso exclusivo à denúncia do Ministério Público Eleitoral (MPE), que embasa as acusações na prisão de um pastor e uma mulher, em 6 de outubro de 2018, por compra de votos em Caracaraí, Sul do estado. Os dois admitiram que trabalhavam para Éder e Cascavel.
FLAGRANTE
A prisão ocorreu após a polícia e o Ministério Público flagrarem uma reunião com vários eleitores em uma casa na região conhecida como Prainha, bairro Nossa Senhora do Livramento.
Os agentes estranharam a aglomeração e a presença de uma caminhonete considerada cara em uma localidade periférica. O veículo estava no nome de um pastor da cidade, que admitiu em depoimento que estava no local para conversar com eleitores, mas ponderou que não esperava por tantos.
Na bolsa da mulher presa foram encontrados R$ 6,6 mil e cadernos com dezenas de nomes, telefones e valores a serem pagos para cada. Nas anotações existiam pagamentos destinados a “militantes” que iam às reuniões e recebiam R$ 100. “Coordenadores”, responsáveis por convocar eleitores, recebiam entre R$ 250 e R$ 300.
Mesmo que Cascavel e Éder não estivessem na casa onde o flagrante ocorreu, o órgão fiscalizador afirma que ambos podem ser considerados autores dos crimes cometidos pelo pastor e a mulher.
“[…] o fato de a prática nefasta em comento não ter sido praticada diretamente pelos representados não ilide a responsabilidade deles, na medida em que sobejamente comprovada nos autos a explícita ciência e anuência deles, relativamente às condutas ora narradas, das quais restaram extremamente beneficiados, tanto que Éder Lourinho foi efetivamente eleito para ocupar o cargo de deputado estadual e Cascavel, embora não eleito, obteve muitos votos para deputado federal”, menciona denúncia.
Lourinho foi eleito com 2.851 votos, enquanto Cascavel obteve 10.490, mas ficou de fora da Câmara Federal, e está como suplente.
DEPOIMENTOS
O ministério entrou em contato e ouviu ao menos sete das pessoas que constavam nas anotações da mulher presa. Elas admitiram ter recebido R$ 100 para votar em Éder e Cascavel, em reuniões conduzidas pelo pastor.
Uma das pessoas que confessou ter recebido dinheiro contou que pediu ajuda do pastor para comprar roupas para o filho, pois estava desempregada. Ele prometeu que compraria o vestuário e aproveitou a oportunidade para comprar o voto dela.
“[…] além das roupas, a declarante resolve esclarecer que o pastor ofereceu em troca dos votos em Éder Lourinho e Cascavel a quantia de R$ 100 para cada pessoa que estava presente na reunião. A entrega do dinheiro ficou combinada para o sábado, dia anterior à votação”, narra o documento.
No dia 6 de outubro, o pastor, duas mulheres e outro homem compareceram à residência onde a reunião havia ocorrido e entregaram R$ 100 para cada pessoa que estava no local. Eram mais de 10, de acordo com a denúncia.
Outro depoimento indica que um encontro voltado para comprar votos ocorreu no dia 6 de outubro, no bairro São Franciso, também em Caracaraí. O homem detalhou que assinou a lista porque ficou ajustado que, caso Cascavel e Éder fossem eleitos, ele seria convidado para uma confraternização.
“[…] nomes constantes na lista eram das pessoas que receberiam os R$ 100 em troca dos votos. A reunião estava sendo conduzida por um homem e por uma mulher, os quais o depoente não sabe descrever as características físicas. No local estavam presentes cerca de 15 pessoas e todas receberam R$ 100 para que votassem nos candidatos. As pessoas que ofereceram e entregaram o dinheiro em troca de votos estavam em uma caminhonete clara”, complementa o órgão.
JUSTIFICATIVAS
À Justiça Eleitoral, a defesa de Cascavel alegou que os supostos compradores de votos deveriam ter sido ouvidos no processo e constar como acusados. Por isso, pede que a ação seja arquivada. Além disso, escreveu que os fatos da abordagem policial “não foram bem investigados”.
“Isso se afirma porque é muito claro da leitura do auto de prisão em flagrante que nenhum eleitor foi encontrado naquele momento recebendo qualquer tipo de benesse ou mesmo promessa”, sustenta.
O advogado acrescenta que não havia situação de flagrância, já que “apreensão de dinheiro, material escrito e material de propaganda, em vistoria pessoal, somente autorizaria a instauração de inquérito policial, não a prisão”.
HISTÓRICO
Essa não é a única denúncia eleitoral de 2018 contra Cascavel. Ele é investigado por compra de votos para beneficiar Antonio Denarium (sem partido). O crime teria ocorrido na comunidade Willimon, na Raposa Serra do Sol.
Meses depois, Denarium assumiu a gestão e o empresário do ramo do agronegócio foi escolhido para assumir a presidência da Fundação Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Femarh). O nome foi considerado polêmico e rejeitado pela Assembleia Legislativa.
Ao assumir o Ministério da Saúde, Eduardo Pazuello nomeou Cascavel como assessor especial. Devido à participação ativa do empresário em negociações da pasta, ele chegou a ser conhecido internamente como “ministro de fato”.
No início deste mês, Cascavel foi novamente acolhido por Denarium e nomeado o oitavo secretário de saúde. Já passaram pelo cargo, desde 2019: Ailton Wanderley, Elcio Franco, Cecília Lorenzon, Allan Garcês, Francisco Monteiro, Olivan Júnior e, por último, Marcelo Lopes.
CITADOS
O Governo de Roraima não se manifesta sobre qualquer ação ou possíveis comportamentos que não tenham relação ao exercício do cargo ora ocupado, muito menos de episódios anteriores a sua entrada no primeiro escalão do governo.
Éder Lourinho emitiu o seguinte posicionamento. “A respeito do referido processo tenho a declarar que já foram ouvidas as testemunhas, o próprio Airton Cascavel já declarou ser o responsável de ter entregue esse dinheiro, porém com destinação diferente do que está sendo acusado, inclusive apresentando testemunhas sobre o referido valor pecuniário”.
O deputado lamentou o episódio e disse esperar pelo esclarecimento da Justiça. “Desde o dia em que eu soube disso tenho de certa forma sofrido por me sentir maculado, através de uma acusação que, sinceramente, nunca tive a menor intenção de praticar, pois sou de uma família humilde e honrada onde o nome limpo vale muito mais que qualquer cargo ou dinheiro, e estou esperando com muita fé, primeiramente em Deus, e também na Justiça Eleitoral que tudo isso seja esclarecido.
Informações: Roraima em Tempo