Documentos oficiais são encontrados no lixo em antigo prédio da Secretaria de Educação de RR

Frequência escolar e documentos relacionados ao censo estão entre a papelada deixada para trás - Bryan Araújo/Roraima em Tempo
Frequência escolar e documentos relacionados ao censo estão entre a papelada deixada para trás – Bryan Araújo/Roraima em Tempo

O prédio sem qualquer identificação e com portas fechadas representa duas vertentes em meio ao Centro Cívico de Boa Vista. De um lado a realidade do abandono predial por parte do Poder Executivo nos últimos anos, e do outro a mudança no cenário causado pela ocupação de venezuelanos que utilizam o local como moradia.

Roraima em Tempo acompanha a realidade dos prédios públicos abandonados na capital e que pertencem ao Estado. Essa é a segunda reportagem especial sobre as mais de dez unidades prediais que estão em situação precária e boa parte serve como moradia improvisada para imigrantes.

Na antiga Secretaria Estadual de Educação e Desporto (Seed), a estrutura precária é visível de longe. Paredes depredadas e os prejuízos de dois incêndios que ocorreram em abril de 2018 e 2019 formam o ambiente.

Além da falta de utilização predial, inúmeros documentos da secretaria foram deixados para trás. Frequências escolares, relações de alunos, professores e diretores, com dados pessoais, foram encontrados facilmente pela reportagem.

Amontoados em um canto da secretaria, os documentos ficaram disponíveis por meses para qualquer pessoa que adentrassem no prédio. Endereços, CPFs, ofícios e folhas de pagamentos estavam entre os papéis. Durante a visita da reportagem, a papelada estava dentro de sacos de lixo, organizados pelos imigrantes que ocupam o prédio, prontos para serem levados.

Segundo eles, a limpeza teve de ser feita após meses de descaso. O lixo acumulava sujeira por conta das chuvas e poeira. Entre os materiais recolhidos, os moradores mostraram toners de impressoras lacrados, teclados e monitores de computadores antigos. A reportagem analisou os conteúdos, mas nada foi retirado do prédio.

A organização da moradia improvisada é diversificada. Alguns ocupam barracos de MDF ou madeira e outros estão dentro do prédio, onde há vários blocos que dividem os moradores. Não há telhas na maior parte, nem portas e janelas. Nos temporais, a água invade e inviabiliza a permanência de mais pessoas.

São quase 400 pessoas morando entre os escombros. Jhiliannys Coa, de 13 anos, é uma delas. Com o português na ponta da língua, contou que estão no local há cinco meses e que a única alternativa para ter um teto sob a cabeça, junto com a família, era a ocupação. “Antes estávamos na rua, não tem abrigo”, relembrou.

Já em outra parte do prédio, localizado mais a frente e próximo à rua central, 138 ocupam o ambiente, entre crianças, grávidas e pessoas com necessidades especiais. Com energia improvisada, os imigrantes aproveitam a única coisa que conseguiram encontrar facilmente: água encanada. Dentro da estrutura, divisões foram feitas com pedaços de madeira para criar novos cômodos.

Conforme explicou um coordenador do abrigo improvisado, Adrian Aaranda, de 23 anos, ao chegar ao local havia muito lixo e restos do que foi a secretaria. Assim como em outros abrigos irregulares, há regras para manter o ambiente limpo por todos os moradores. Mesmo com os riscos, ele garante que nunca houve vistoria do Corpo de Bombeiros para definir se poderiam permanecer morando no prédio.

Dados pessoas de servidores podem ser acessados por quem estiver no antigo prédio – Foto: Bryan Araújo/Roraima em Tempo

DEPÓSITO

O descaso na Seed se estende até a Avenida Mario Homem de Melo, zona Oeste de Boa Vista. À margem da rua, imigrantes improvisaram morada na fachada do prédio onde funcionava um depósito da secretaria. Eles ocupam somente esse espaço, já que na parte de trás, o depósito funciona como despejo de materiais inutilizados.

Roraima em Tempo entrou no local e encontrou cadeiras escolas, ar-condicionado, instrumentos de fanfarras, armários velhos. Há também livros, documentos e DVDs no local. Atualmente, o prédio serve para que servidores façam reparos em fogões antigos.

MPRR

No governo de Suely Campos (PP), foi instaurado procedimento para reconhecer o prédio da Seed como patrimônio público. Entretanto, ao assumir o cargo, Antonio Denarium (PSL) derrubou a solicitação com a justificativa da crise financeira estadual.

O Ministério Público do Estado de Roraima (MPRR), por meio da Promotoria do Patrimônio Público, tem buscado soluções judiciais para que o Poder Executivo seja responsabilizado pelo abandono do prédio e faça medidas para a restauração do local.

O atual governo não retornou os questionamentos feitos pela reportagem.

Informações: Roraima em Tempo