Presos com TVs, frigobar, aparelhos de ginástica, com livre direito a visitas íntimas, caminhadas pela prisão e com o poder de até mesmo pedir comida por “delivery”. Esses são alguns dos privilégios que internos do Comando de Policiamento da Capital (CPC) possuem, segundo denúncia do Ministério Público do Estado de Roraima (MPRR).
As informações constam em um pedido do órgão encaminhado ao Tribunal de Justiça de Roraima (TJRR), ao qual a reportagem teve acesso. Nele, são exigidas adequações do CPC, unidade utilizada em Roraima para a prisão de agentes da Segurança Pública.
“Enquanto os reeducandos da PAMC [Penitenciária Agrícola de Monte Cristo] aglomeram-se em uma cela de 6m² contendo 15 indivíduos, ao revés, presos no CPC detinham TVs, frigobar e até mesmo aparelhos para ginástica, não se olvidando do livre ingresso de guloseimas, visitas íntimas e pessoais em horários livres”, menciona denúncia.
No fim de dezembro de 2020, a titular da Vara de Execuções Penais, Joana Sarmento, determinou que a Polícia Militar de Roraima (PMRR), Governo de Roraima, Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-RR) e a Defensoria Pública se pronunciem sobre o caso.
LIBERDADES
Mesmo que o CPC não seja uma unidade prisional, o local abriga presos devido à falta de estrutura do Sistema Penitenciário de Roraima, e oferece prisões em todas as peculiaridades necessárias. Por isso, o quartel deve seguir regulamentos previstos para presídios como forma de assegurar o tratamento igualitário de detentos.
Contudo, na prática, internos não só detêm bens materiais em celas, como também são escoltados para fazer compras, descumprem ordem de guardas sob argumento de hierarquia de patente e vestem a farda militar.
“[…] mesmo sem a formação da culpa, em custódias cautelares, considera-se o policial militar na condição de agregado [deixando de ocupar vaga na escala hierárquica, nela permanecendo sem número], pois afastado temporariamente de seu serviço ativo”, argumenta o órgão.
Outra crítica diz respeito à estrutura do CPC. Além de não haver grades, as portas são de madeira, não há sistema eletrônico de vigilância e os muros podem ser esquivados com pulo.
“Singela vistoria naquela unidade [dita prisional] viabiliza conclusão de que custodiados não fogem porque realmente não querem. […] defronte à unidade prisional, há um colégio de ensino infantil, muito embora existam segregados por estupro de vulneráveis, roubos e até mesmo assassinatos”, complementa o MPRR.
A denúncia também cita a falta de vistorias nas celas do CPC, o que possibilita que celulares cheguem aos internos com ajuda de visitantes, que não passam por revista.
“E nem se cogite sustentar dificuldade no cumprimento da medida, já que existem apenas 19 custodiados naquele local, não sendo crível que singela revista diária, ainda que de modo superficial, não possa ser realizada”, frisa.
Confira na íntegra a lista de regalias apontadas pelo MPRR:
- Familiar de presos, detentor de posto de oficial, almejando ingressar sem nenhuma revista e em horário indistinto;
- Presos comparecendo em consulta médica, sob escolta, mas com farda militar (uniformizado), como se ainda estivesse em atividade;
- Presos comparecendo em consultas médicas, desnecessárias, sob escolta, tão somente com escopo de reunir-se com familiares naquele ambiente;
- Preso sendo escoltado para compras em material de construção e mercado, com subsequente transporte do produto para a própria residência;
- Presos realizando encomendas de comidas via “delivery”;
- Presos com guloseimas em quartos;
- Recorrentes apreensões de celulares, sem nunca ter sido instaurado IP ou IPM para apurar o delito do art. 319-A do CP, pois nunca identificados os responsáveis (o que, no mínimo, demonstra contumácia na falha da própria segurança);
- Presos descumprindo ordens da guarda, inclusive requerendo continência, sob argumento de superioridade hierárquica;
- Presos recebendo e despedindo-se de familiares na própria “cancela de saídas de veículos”, sem algemas e/ou escolta, ou seja, sem empecilhos para fuga;
- Presos com livre trânsito no CPC;
- Presos com visitas (de cunho pessoal) livres de políticos e autoridades, desvigiadas, sem revista ou controle de tempo, sem finalidade institucional, e, inclusive, sem nenhuma formalização ou registro de acesso.
CITADA
A Polícia Militar de Roraima informa que o Comando de Policiamento da Capital é uma unidade operacional, responsável pelo policiamento ostensivo e preventivo em Boa Vista, e embora não seja uma unidade prisional, tem sob responsabilidade, por imposição da lei, a custódia de internos e nestas circunstâncias, de forma subsidiária, responde perante o Juízo da Vara de Execução Penal e Ministério Público da Vara de Execução Penal.
Ressalta que toda e qualquer solicitação da Justiça será prontamente atendida pela Corporação.
As revistas estão sendo realizadas com frequência em horários e dias diferenciados, com o objetivo de retirar objetos não permitidos e as medidas decorrentes adotadas são remetidas ao Juízo da Vara de Execução Penal.
Em relação à alimentação, a mesma é fornecida pela Secretaria de Justiça e Cidadania, a mesma consumida nos presídios do Estado.
A saída de internos das instalações do Comando de Policiamento da Capital é controlada e fiscalizada, mediante autorização de saída por parte da Justiça, com horário de saída, retorno e mediante acompanhamento (escolta).
A Polícia Militar de Roraima reitera o compromisso em proteger e servir à sociedade roraimense nas mais diversas ações de segurança e em apoio à Justiça.
Informações: Roraima em Tempo – Foto: Yara Walker